Montesquieu e o duodécimo

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Em meu programa de rádio, tenho acompanhado com enorme atenção o andamento do pacote de austeridade do governador Sartori que está sendo votado na Assembleia gaúcha. Aqui no site, também tenho trazido informações sobre a situação financeira do estado, com foco no contexto que levou o Rio Grande do Sul ao atual ambiente de caos financeiro.

Tenho defendido as medidas apresentadas pelo atual governo, ressaltando sempre que elas vieram com dois anos de atraso. Sartori deveria tê-las apresentado no início de sua administração. Mas o que importa é que, mesmo tardiamente, o debate sobre o tamanho da presença do estado finalmente está na boca do povo, ainda que um tanto maquiado pela espuma da politicagem e dos interesses corporativos.

O fato é, entretanto, que nem tudo são flores nas votações até aqui ocorridas. Talvez, do conjunto todo já discutido pelos parlamentares, tenha sido reprovada aquela que era a medida mais significativa do ponto de vista da sanidade da repartição de recursos: a proposta de um novo cálculo para o duodécimo.

Antes de mais nada, é importante explicar o que é o duodécimo e qual o motivo de o governo defender sua alteração. Trata-se do repasse de recursos estatais feitos pelo Executivo para o Judiciário, Legislativo e demais órgãos públicos. O duodécimo está ancorado na tripartição dos poderes, que prevê, além da harmonia, também a independência, inclusive financeira, entre eles. É o Executivo quem arrecada, mas precisa destinar parte da receita advinda para que os demais poderes possam gerir suas próprias contas, incluindo ai investimentos e pagamento de folha salarial.

A proposta que foi votada em dezembro:

Atualmente, o duodécimo é calculado com base nas receitas orçamentárias do Estado. Qual o problema básico disso? Receitas orçamentárias, e assim o sabem bem os prefeitos dos municípios brasileiros, na maioria das vezes, acabam não sendo cumpridas. Não por falta de competência de quem monta o orçamento, mas pelas imprevisibilidades econômicas que geram a diminuição de receitas, atrasos em repasses intergovernamentais, entre outros fatores fundamentais que não necessariamente ligados a administração pública.

O que o governo Sartori pretendia era amparar o repasse de recursos para os outros poderes com base na arrecadação efetuada. A medida traria sanidade financeira para repartição, visto que ela seria baseada em dinheiro que de fato foi obtido junto aos pagadores de impostos, e não em uma abstração contábil como é a previsão orçamentária. Com a aprovação, 700 milhões seriam economizados todos os anos.

Infelizmente, devido a defecções e abstenções na base do governo, e também a enorme pressão de representantes de outros poderes e órgãos públicos, o projeto não passou. Resta a Sartori recorrer ao STF, onde uma decisão favorável ao governo do Rio de Janeiro serve de precedente para que ele ao menos tenha esperança de uma possível reversão na justiça.

Quando Montequieu formulou sua teoria de tripartição, pensava em delimitar competências e atribuições para Executivo, Legislativo e Judiciário, de forma que juntos e em sintonia pudessem levar a um bom governo para a sociedade. Não se pode distorcer essa fórmula política de modo a proteger uma verdadeira injustiça financeira. Não se pretende tirar recursos de ninguém, apenas racionalizá-los. O recalculo do duodécimo é uma medida que o filósofo francês aplaudiria com entusiasmo, uma vez que traria equidade para a fonte de receita dos três poderes.

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