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Por um modelo de educação para a vida

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Não é de hoje que a educação se tornou um tema relevante para as pautas nacionais. Tornou-se jargão comum em campanhas políticas, com palavras jogadas ao vento, normatizado pela Constituição Federal, porém muito pouco compreendida: tudo se resume a questões de investimentos.

Entre os dias 5 e 9 de março de 1990, foi realizada em Jomtien, na Tailândia, a Conferência Mundial de Educação para Todos, patrocinada pelo Programa das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pelo Banco Mundial. Neste ato, fora elaborada e aprovada a Declaração Mundial sobre Educação para Todos, que nada mais é do que um plano de ação para atender as necessidades básicas de aprendizagem.

O objetivo dessa conferência foi promover a universalização do acesso à educação e a promoção da equidade, dando prioridade à aprendizagem, ampliando os meios e alcance da educação básica e fortalecendo o ajuste de ações educativas. Nesse contexto, o Brasil assumiu o compromisso de implementar as ações afirmativas na área da educação.

A Organização das Nações Unidas (ONU) vem, desde suas origens, buscando mecanismos de atuação sobre a soberania de seus Estados-membros, sendo que muitos de seus atos possuem força de norma constitucional no Brasil. É claro que os olhos da ONU são incapazes de atender as demandas locais, tratando a educação apenas como um esforço de melhoria de dados quantitativos, jamais qualitativos.

O Brasil se perdeu no meio de tantas recomendações, porque a universalização do ensino, ao contrário do que se pensa, não é assunto recente. A Ratio Studiorum foi o documento base elaborado pelos jesuítas no século XVI que padronizava o ensino nos colégios da Companhia de Jesus[1]. Tratava-se de um projeto educativo da Companhia de Jesus, cujo olhar era também direcionado para questões espirituais de formação, e não apenas de empilhamentos de conteúdo sem valor.

Outra prova que se dispõe para acabar com o argumento de que a educação era exclusiva para as elites no Brasil está contida na Bula Veritas Ipsa, de Paulo III, dada em Roma, no ano de 1537[2], para a qual: “A mesma Verdade, que nem pode enganar, nem ser enganada, quando mandava os Pregadores de sua Fé a exercitar este ofício, sabemos que disse: Ide, e ensinai a todas as gentes. A todas disse, indiferentemente, porque todas são capazes de receber a doutrina de nossa Fé.”

Ao contrário do que se costuma propagar, sempre houve uma preocupação pela formação das almas, base do ensino em todo Império português. O Regimento das Missões, decretado por Pedro II, então Rei de Portugal, em 1686, estabelecia o ensino da fé católica e da língua portuguesa em território nacional, além de ter sido um dos documentos que fundamentos as bases da unidade nacional.[3] Com o fim da Monarquia no Brasil, a ideia de formação voltada para uma unidade nacional se perdeu no meio de políticas desastrosas de educação, cujos efeitos são sentidos até hoje.

Sêneca, o Filósofo, constatou numa amarga citação que “não aprendemos para a vida, mas para a escola” (Non vitae, sed scholae discimus). Para o pensador, a escola não é um fim em si mesma, mas formativa. Portanto, a preocupação de que o ensino fosse voltado para a vida vem desde a Antiguidade.

Paideia, a formação do homem grego, era um modelo de formação sem igual nos dias de hoje que não residia no acúmulo de conteúdo em si mesmo, na teoria abstrata, mas num conjunto de valores que se concretizavam com a formação de homens para a vida. Para tal, a educação seria uma transformação do indivíduo para atuação na vida em sociedade, no sentido de converter o esforço humano, como um processo de construção consciente. Não há de se negar que o que hoje se entende por cultura está aquém desse modelo, deteriorado.

O homem não é educado se não for esfolado”, diz um monóstico de Menandro, um princípio pedagógico bem conhecido na Antiguidade. Há muitas variações para esta frase. No entanto, a ideia é que a correção e a força das circunstâncias são essenciais para a boa educação. Assim, não seria possível distanciar a educação de seus elementos transformadores sobre o espírito humano.

Para Josemaria Escrivá, o estudo reside em não muitas coisas, mas em profundidade (Non multa, sed multum). No entanto, as políticas nacionais de educação se tornaram verdadeiros empilhamentos de conteúdo sem qualquer valor prático para a vida em sociedade, muito pelo contrário.

Vê-se, pelos motivos acima apontados, que o modelo ideal da educação está longe de se concretizar por ações afirmativas, como quer o poder público. O ideal está em partir da seguinte pergunta: “Que tipo de homens queremos nos tornar?”. A partir daí, então, uma vida de formação individual poderá ser construída em conjunto com a tradicional via institucional, que infelizmente ainda não é possível ser completamente ignorada.

 

Notas:

[1] O documento pode ser consultado no endereço a seguir:https://run.unl.pt/bitstream/10362/10952/1/Tese%20-%20Ratio%20Studiorum.pdf

[2] O documento pode ser consultado no seguinte endereço:http://www.montfort.org.br/bra/documentos/decretos/veritas_ipsa/

[3] PORTUGAL.. Leis, decretos, etc. Regimento, & Leys sobre as Missoens do Estado do Maranhaõ, & Parà, & sobre a liberdade dos Indios. – Impresso por ordem de El-Rey nosso Senhor. – Lisboa Occidental : na Officina de Antonio Manescal, impressor do Santo Officio, & livreiro de Sua Magestade, 1724.

 

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