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Imparcialidade à brasileira: Plenário do STF conclui que próprio inquérito é constitucional

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Por dez votos a um, prevaleceu o entendimento de que a portaria da Presidência do STF que deu início às investigações é constitucional.

Conforme divulgado pelo portal do Supremo, o Plenário do STF concluiu o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 572 para declarar a legalidade e a constitucionalidade do Inquérito (INQ) 4781, instaurado com o objetivo de investigar a existência de fake news, denunciações caluniosas e ameaças contra a Corte, seus ministros e familiares.

Por dez votos a um, prevaleceu o entendimento do relator, ministro Edson Fachin, de que a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 572, cujo objeto era a Portaria 69/2019 da Presidência do STF, que determinou a instauração do inquérito, é totalmente improcedente, “diante de incitamento ao fechamento do STF, de ameaça de morte ou de prisão de seus membros e de apregoada desobediência a decisões judiciais”. Ficou vencido o ministro Marco Aurélio, que julgou procedente a ADPF.

Primeira a votar, a ministra Rosa Weber observou que o sistema processual penal não confere às polícias judiciais a exclusividade da investigação criminal e que não há qualquer obstáculo legal à investigação administrativa no âmbito dos três Poderes. Ela lembrou que, ao exercer a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), já havia registrado a preocupação com os efeitos “nefastos” das notícias falsas sobre o processo democrático no país, ao constatar que a desinformação divulgada em larga escala passou a influenciar diretamente as escolhas da sociedade nos mais variados temas.

O ministro Luiz Fux afirmou que a legislação brasileira autoriza que juízes, ao verificar a existência de crime, iniciem investigações, especialmente em defesa da jurisdição. Segundo ele, os fatos investigados no INQ 4781 (atos de abuso, de ofensa, de atentado à dignidade da Justiça, do Supremo e da democracia) são “gravíssimos” e se enquadram no Código Penal, na Lei de Segurança Nacional e na Lei de Organizações Criminosas.

Para a ministra Cármen Lúcia, o inquérito não trata do cerceamento de liberdade, mas da garantia de liberdades e direitos essenciais. Segundo ela, o STF não permite qualquer tipo de censura, mas não é possível considerar como protegidos pela liberdade de expressão atos que atentem contra a Constituição, incitem o ódio ou o cometimento de crimes.

O ministro Ricardo Lewandowski também seguiu o relator pela constitucionalidade da Portaria GP 69/2019, que instaurou o INQ 4781, pois entende que o feito visa apurar ofensas que atingem não só os integrantes do Supremo, mas também seus familiares e servidores da instituição. Em relação à possibilidade de investigação administrativa pelos Poderes da República, ele lembrou que o STF reconheceu essas atribuições quanto à polícia legislativa do Congresso Nacional, ao permitir, inclusive, a prisão, no caso de crimes cometidos em suas dependências.

O ministro Gilmar Mendes também entendeu não haver vícios na instauração do inquérito, pois os objetos e fatos da investigação foram devidamente delimitados. Ele destacou a gravidade dos fatos e afirmou que o uso sistemático de robôs para divulgar notícias falsas e ameaças não é liberdade de expressão, mas um movimento orquestrado para afetar a credibilidade do STF. Na sua avaliação, a divulgação massiva de notícias inverídicas viola o direito da sociedade de ser devidamente informada.

O ministro Celso de Mello observou, em seu voto, que o STF tem a função extraordinária e atípica de apurar qualquer lesão real ou potencial a sua independência, e as regras do Regimento Interno do STF que fundamentaram a instauração do inquérito se qualificam como instrumento de proteção e defesa da ordem e da constitucionalidade. Segundo ele, não teria sentido retirar do Tribunal instrumentos que o permitam, de forma efetiva, proteger a ordem democrática, o Estado Democrático de Direito e a própria instituição. Para o decano, a máquina de notícias fraudulentas se assemelha às organizações criminosas, mas com o propósito de coagir a instituição.

O presidente do STF, ministro Dias Toffoli, afirmou que, há algum tempo, o Tribunal e seus ministros sofrem ataques e têm sua integridade e sua honorabilidade ameaçadas por milícias digitais que buscam atingir a instituição e o Estado Democrático de Direito. Segundo o ministro, a instauração do inquérito, por meio de portaria assinada por ele, é uma prerrogativa de reação institucional que se tornou necessária em razão da escalada das agressões cometidas contra o Tribunal. Ele lembrou que tomou a iniciativa apenas depois de constatar a “inércia ou a complacência daqueles que deveriam adotar medidas para evitar o aumento do número e da intensidade de tais ataques”.

Único a divergir, o ministro Marco Aurélio considera que o artigo 43 do Regimento Interno do STF, que embasa a instauração do inquérito, não foi recepcionado pela Constituição de 1988. Para o ministro, houve violação do sistema penal acusatório constitucional, que separa as funções de acusar, pois o procedimento investigativo não foi provocado pelo procurador-geral da República, e esse vício inicial contamina sua tramitação. Segundo ele, as investigações têm como objeto manifestações críticas contra os ministros que, em seu entendimento, estão protegidas pela liberdade de expressão e de pensamento.

OAB requer ao STF urgência na apreciação da liminar para garantir acesso de advogados aos autos

Conforme divulgado pelo seu portal de notícias, a OAB Nacional deu entrada no STF, nesta quarta-feira (1º), com pedido de urgência na apreciação de concessão de medida liminar requerida nos autos do habeas corpus 186.492. No dia 29 de maio, a Ordem impetrou um habeas corpus com pedido de medida liminar em favor dos advogados dos investigados no inquérito que trata das fake news. As reclamações acerca da falta de acesso aos autos têm gerado uma reação da advocacia e a OAB vem atuando em defesa das prerrogativas profissionais. Conforme pontuou o secretário-geral da Ordem, José Alberto Simonetti:

O acesso aos autos é uma prerrogativa inafastável do cidadão, exercida pelo advogado. Sem esse pressuposto não há direito de defesa nem devido processo legal. Nenhum fundamento justifica o descumprimento deste requisito básico de validade de uma investigação. A OAB possui compromisso, sempre, com as garantias dos cidadãos e as prerrogativas dos advogados.

O inquérito que investiga a questão das fake news tem a relatoria do ministro Alexandre de Moraes e tramita sob segredo de justiça. A Ordem tem sido procurada também por advogados que atuam em outro inquérito conduzido no STF, o que apura a realização de atos antidemocráticos em Brasília, com o mesmo tipo de reclamação: falta de acesso aos autos. Segundo o procurador nacional de defesa das prerrogativas, Alex Sarkis, preocupa o fato de que uma posição não tenha sido manifestada em relação ao HC com a proximidade do recesso do judiciário:

A Procuradoria Nacional de Defesa de Prerrogativas da OAB Nacional está desde o final do mês de maio perseguindo a decisão liminar para garantir aos advogados o pleno acesso aos autos do inquérito 4781. Não queremos crer que entraremos no recesso sem essa importante decisão. Se isso ocorrer, a OAB buscará mais providências jurídicas para provocar a análise desse pleito. A advocacia e suas prerrogativas são importantes valores para o equilíbrio da democracia e devem ser respeitadas como prova, inclusive, de solidez democrática.

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